NO BALANÇO DAS TRÍADES
O poema me
suscitou emoções muito dadas por fatos que me aconteceram dentro e fora do
“meio”. Todas essas coisas, esses fatos, me fizeram ver que o amor e a
submissão, o enamoramento e o domínio, são todas facetas distintas do mesmo
processo.
Parece-me
que algumas pessoas têm resistência máxima em admitirem-se nesse processo de
sedução, conquista, realimentação/revisão das expectativas, renovação e
inclusive a separação e o distanciamento. Pergunto-me porque e encontro uma
resposta que para mim , respeitadas as opiniões divergentes, bizarra: temem os
dominadores (as) que a sua autoridade seja solapada por mostrarem-se
interagentes no processo que uniu Dominador(a)/submisso(a).
O poema de
Adélia, nesse sentido, mostra um antídoto à essa visão torta: é através do
sentir-se acolhida, aceita, legitimada que procedeu-se à submissão, à entrega e
à sacralização que tornou-se indispensável para atingir-se o estado que fez da
personagem uma cultuadora, cuidadora e devota de seu amado.
Talvez
falte-nos , ou ao menos para alguns, a visão de uma pessoa em presença, fisica,
icônica ou real (segundo o sentimento de cada um) , de um santo. Jogado de
joelhos, não pede, implora pelo seu favor. Já presenciei em Igreja de minha
cidade, uma mulher que atirou-se ao chão para humilhar-se e pedir uma cura.
A quem mais
poderia se tributar tanta reverência e poder senão ao ser que poderia
retirar-lhe de sua angústia e de devolver-lhe aquilo que perdera, no caso, a
saúde?
A quem mais
um(a) submisso(a) consciente de que sua felicidade está diretamente ligada ao
ser aceita e legitimada em sua forma de sentir prazer, tributaria fidelidade,
desvelo e serviço? Com certeza àquele(a) em quem reconhecesse tal capacidade e
tal poder. Portanto, ao meu ver, o enamoramento e a dedicação são os únicos
meios de chegar-se à tal devoção, necessitando de um empenho especial por parte
do(a) Dominador(a) para que tal estágio seja atingido.
Ao ver
alguns casais “BDSMistas” não tenho quaisquer dúvidas que ocorra algo assim. No
entanto, se nem no “baunilhismo” isso é norma, não esperaria que fosse possível
no BDSM que não tem, em essência, tanta diferença assim das práticas habituais,
só tem um caráter um tanto diferente nas práticas.
Isso
contempla uma das tríades que H. propôs tão bem, o “Nós dos Nós”. Lembro-me que
ali ela pontua que as emoções transcendiam as dores e chegavam à unir almas em
algo muito maior , unindo almas e corações. Perfeito!
Passei boa
parte da tarde (estou escrevendo na noite/madrugada) pensando o que o
masoquismo supostamente afetaria nessa construção que o poema propôs. Concluo
que o masoquismo não aspira consumir-se
em si , apesar de poder aspirar a isso eventualmente. No entanto, se prazer
causa, carece e espera realimentar-se para tornar a ser satisfatório até quando
isso não mais ocorra e transmute-se, eventualmente, em algo mais (ou menos).
Portanto, a
concepção do “Nós de nós” está vinculado ao prazer, à dimensão criadora da
vida. E a união só se legitima no prazer que aspira e na realização dele.
E o “Tocar
as raias”? Será que poderíamos afirmar que “Tocar as raias” é um processo
físico, de chegar aos extremos nas práticas? Todos sabem que não. Na verdade,
mesmo a prática mais extrema não tem sentido nenhum se não vier secundada de
uma profunda ligação erótico-afetiva.
A falta
dessa percepção, na minha opinião, empobrece muito o diálogo D/s. Reduzir essa
relação em um bate/apanha é empobrecê-la , sem com isso fazer qualquer
condenação a quem se proponha a viver algo assim.
E é esse a
grande lição que o poema aponta: a submissão talvez não necessite,
necessariamente, das práticas mas do grau de sedução que um(a) Dominador(a) tem
sob seu submisso(a) e vice e versa.
Alguém tem
alguma dúvida que isso também aconteça no enamoramento mais “comum”? Quem
confrontado com um(a) “adversário(a)” não empunha todas as armas para
afastá-lo? Quem, tendo a “coleira” devolvida, o rompimento do pacto original,
não se desestruture? Quem, em separando-se definitivamente do(a) amado(a) não
perca o próprio significado de sua vida?
Para
encerrar: a maior lição que esse poema nos dá é a da intensidade da entrega,
seja no “baunilhismo” seja no BDSMismo. Isso deve inquietar ao nos instigar a
pensar em que entrega e que Dominação estamos exercendo. Saber que os
mecanismos são sutis e a prática não
pode ser menos sensível à essa sutileza.
Transformar
a realidade falsamente árida que o BDSM propõe para uma plenitude que o poema
transborda. Algo para a reflexão. Desculpe se essa foi muito extensa.
Saudações à
todos.
Oi, Master Janus.
ResponderExcluirEntrei no teu blog e tive a possibilidade de ler alguns destes depoimentos, os quais me inspiraram para escrever uma reflexão, conforme tu falas logo no início deste.
Me chamo Gitma.
Conheço um pouco sobre BDSM, mas nunca como praticante, o que considero uma lástima.
Entre tantos contos, histórias e estórias que já li, fica sempre a mesma pergunta: “Onde estão estes homens Dom?”…”Eles realmente existem?”
Em um mundo cada vez mais competitivo e incauto, me questiono se a relação Dom/Sub existe realmente na essência da definição!
Sou uma mulher extremamente feminina e sei claramente o tipo de homem que admiro, porém mais uma vez, me questiono: “Os homens Dom existem?”
Onde está o homem que devora sua mulher como se fosse seu alimento principal?
Onde seu prazer inicia no dar prazer a sua Sub?
Que admira e valoriza sua entrega?
Que sabe a importância e cuida seus sentimentos e suas fraquezas?
Que decide, por que sabe o que é melhor para sua Sub?
Onde está este homem? Ele existe?
——
Para mim, esta relação (DS) ocorre em parte pela busca do prazer, sem preconceito ou vergonha.
(Tudo bem… Também quero!)
Porém, considero completa e imagino tudo de bom se, além disso, tiver um homem Dom que sabe comandar, mesmo que seja somente nestas horas.
——
Master Janus, senti falta das tuas reflexões!
(Este comentário diz respeito ao antigo Blog "Mestre JB". Sorry, mas só soube deste Blog atual exatamente agora)